A ORDEM DE CARONTE, Capitulo III: David

E aí galera. Estou trazendo mais um capítulo do conto (nem sei se ainda pode se chamar assim pelo jeito que ele vem se formando) A Ordem de Caronte! Hoje vocês vão conhecer o Inspetor Davidum talento desperdiçado na cidade de Montgomery que foi interpretado pelo nosso parceiro Ernane Ribeiro.

Qualquer dúvida, dica e correção estou a disposição. Boa leitura! ;)

Willian Costa

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David olhava para os seus sapatos novos cobertos de esterco. Não acreditava que era a segunda vez na semana que não prestava atenção por onde pisava. Se adaptar aquela cidade estava esgotando sua autoestima.

Havia sido chamado cedo para substituir o chefe de policia sobre o desaparecimento de um menino. Ao que parece, a mãe do desaparecido estava fazendo uma cena na delegacia. Chegando ao local, limpou o sapato em um dos degraus da velha delegacia e pediu para que um garoto que passava por ali lhe trouxesse um balde com água.


Após estar limpo e mais apresentável, o inspetor entra e encontra uma jovem negra vestida com roupas simples e os olhos fundos do que ele julgou serem lágrimas. Seu rosto era um misto de cansaço, raiva e tristeza.


- Senhora Judith? – chamou.


- Onde está o chefe de policia? – rugiu a moça se levantando do banco onde esperava impaciente – Ele tem que mandar homens para buscar meu esposo e meu filho!


- Calma senhora. – falou, mas notou que era perca de tempo pedir isso a mulher – A senhorita Daves me disse ao telefone que você suspeita que...


- Solomon! – gritou ela – Será que vocês são cegos para não ver isso?


Aquilo deixou David tenso. Morava há pouco tempo em Montgomery, mas já conhecia bem os nomes importantes da região. O de Solomon era um deles. Talvez o mais importante, mas David ainda não tinha se aprofundado na forma que a sociedade da antiga capital sulista se organizava. A recepcionista arregalou os olhos e se encolheu em sua cadeira ao ouvir novamente a suspeita da moça.


- Tem noção da acusação que está fazendo senhora? – disse o mais cauteloso possível – Há alguma prova?


- Tenho mais meia dúzia de casos parecidos senhor! – Judith diminuíra o tom de voz, mas a fúria permanecia – Outra meia dúzia de esposas em minha vila que esperam os maridos retornarem e ainda há aquela mulher! – apontou.


David olhou para onde a moça apontava. No canto da sala sentada num banco de madeira,  uma senhora negra com seus mais de cinquenta anos estava choramingando calada com o pensamento longe. Ao notar que a estavam olhando, a senhora encarou o jovem inspetor e David pode sentir toda a angústia que o olhar baixo e úmido da mulher expressava.


- A filha desapareceu ontem à noite também. – começou Judith – Ela mora em uma das terras “cedidas” pelo Solomon. Assim como a dos outros desaparecimentos.


David sabia desses desaparecimentos. Porém, poucas pessoas iam até a delegacia dar queixa. Outras voltavam e retiravam a denuncia. Ele queria investigar, mas a burocracia o impedia e ainda assim estava submetido ao Chefe Hanagam. “Você é um talento desperdiçado nessa cidade”, costumava dizer Hanagam. “ Seria mais bem aproveitado nas cidades nortistas de onde veio”.


O sinete da porta soou quando ela se abriu. Ia entrando um homem grande de cabeça baixa e arrastando a bota cheia de esterco no chão de madeira enquanto praguejava insultos.


- Deram para cagar em escadas agora! – resmungou o homem.


O inspetor já o havia visto algumas vezes. Na verdade, na noite passada havia ganhado um punhado de dólares apostando nele numa queda de braço disputada na Taverna do Tota. Houve uma confusão logo após isso, mas o jovem inspetor já estava no andar de cima gastando sua recente pequena fortuna com Adelaide, uma das “dançarinas” da taverna.


- Vamos até minha sala senhora – disse colocando uma das mãos no braço de Judith.


-Não encosta a mão em mim! – gritou a negra se livrando da mão do inspetor.


Ned então reparou no casal ao meio da recepção. Logo reconheceu a mulher. Os homens que quase o atropelaram haviam deixado para trás um relicário contendo sua foto. Ned também reconheceu o inspetor da noite anterior.


- Ei você! – chamou Ned – A moça.


Judith e David cessaram a pequena rixa e encaram confusos o lenhador.


- O que quer de mim? – disse Judith altiva e séria.


- Acho que deve saber a quem isso pertence. – e tirando o cordão metálico do bolso, o expôs de braço erguido a frente.


Judith sofreu uma nova onda de sensações. Ela instintivamente tocou a cópia do relicário que tinha em volta do seu pescoço e meio segundo depois se descontrolou! Ela avançou sobre o homem o arranhando,  dando tapas, murros e pontapés, gritando palavras como “Assassino!” e “Demônio!”. Ned pouco se defendia dos golpes, pois não entendia o que estava acontecendo.  O inspetor tentou separar a mulher do lenhador, mas teve que pedir reforço. Dois policiais aparecem. Um ajudou David a separa a mulher de perto do homem e  o outro a mando do inspetor saca uma algema a frente de Ned.


- Hei, hei, hei. O que significa isso, chefia?! – grita Ned sem entender.


- Virou suspeito no desaparecimento de um homem. – respondeu David.


- Não! – gritou Ned dando um passo para trás. O oficial demonstrando todo seu medo pelo irlandês, se afasta com um movimento brusco – Vocês entenderam errado! Um homem deixou isso cair logo após quase ter me atropelado a cavalo. E você sabe onde eu estava ontem chefia. Ganhou uma nota comigo.


O inspetor refletiu e aceitou a lógica. Judith estava se debatendo nos braços do oficial, ouvindo tudo o que o brutamontes dizia. O inspetor decidiu deixar o homem de mãos livres e pediu para que ele e Judith fossem encaminhados até sua sala.


Porém, um alvoroço na rua começou a ser ouvido por eles. Pela grande janela frontal, eles notaram homens e mulheres correndo e se afastando de alguma coisa que notoriamente vinha pela rua. O inspetor pede licença à Ned e abre a porta da delegacia para ver o que acontecia.


Por instantes ele viu apenas civis se afastando o mais rápido que podiam do que se aproximava. Ned, a recepcionista e o oficial que estava tentando algemar o lenhador acompanharam o inspetor até o lado de fora.


Descendo pela rua a trote lento, vinha um cavalo velho de carga arrastando algo atrás de si. Uma nuvem de poeira acompanhava o animal. O pangaré passou em frente deles e então puderam ver o motivo da algazarra que ouviam. Puxado pelo cavalo, um corpo mutilado deixava um rastro de sangue e couro atrás de si. A carne e as roupas estavam rasgadas e um dos braços estava preso ao corpo somente por um filete de carne e músculo dilacerado. Cães latiam seguindo o horrível desfile.


Da sala de recepção, Judith viu o animal arrastando o corpo. Um terror dominou o coração da jovem e um nome veio em meio a um grito em sua garganta. Ela reconheceu a montaria de seu esposo.

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Bem, é isso por hoje pessoal. Espero que tenham gostado. Até a próxima!

FF

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